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sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

Decisões judiciais: "indenização e internet"

Embora o senso comum ainda entenda que a internet seja "terra de ninguém", as decisões judiciais no Brasil (e no mundo) demonstram que há normas e princípios a serem seguidos, cabendo ao cidadão tomar as devidas cautelas.

Estejam certos que, se houver eventual imprudência, negligência, imperícia ou dolo ao prejudicar outrem, com certeza, o Poder Judiciário agirá. Basta ser provocado.
Neste sentido, apenas para promover a discussão e reflexão daqueles que se interessam pelo tema, citamos algumas decisões judiciais brasileiras que servirão de exemplos de como tem sido o entendimento majoritário sobre os temas envolvendo pedidos de indenização por fatos/atos utilizando-se a internet.

Então, vejamos o que o Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo e do Estado de Minas Gerais:COMPRA VIA INTERNET - VÍCIO DE QUALIDADE DO PRODUTO - DEMORA INJUSTIFICADA DE SUBSTITUIÇÃO DO BEM - DANO MORAL CONFIGURADO - CRITÉRIOS PARA FIXAÇÃO - RECURSO DESPROVIDO. - A entrega de produto diverso daquele adquirido pelo consumidor, através do site na internet, frustrando as legítimas expectativas criadas quando da sua aquisição, somada à ausência, injustificada, de sua entrega nos moldes em que foi adquirido, mesmo após o produto com vício ter sido recolhido pela vendedora, erigem-se em causa de indenização por danos morais, mormente considerando que o bem em referência é essencial para a regular funcionalidade de qualquer residência. - A reparação moral, embora não implique na reposição valorativa de uma perda, haverá de ser suficientemente expressiva, a fim de compensar a vítima pelos sofrimentos e transtornos sofridos, e, ao mesmo tempo, penalizar o causador do dano, ao viso de evitar a repetição de conduta do mesmo gênero (teoria do desestímulo), devendo, ainda, levar em conta o grau da culpa e a capacidade econômica do ofensor. (Apel. 1.0145.07.427478-1/001(1), publicação em 21/09/2009).


Medida cautelar inominada - Internet - UOL - Pretendida retirada pela UOL de veiculação de notícias disponibilizadas na Internet que denigrem a imagem dos requerentes - Notícias veiculadas por terceiro, provedor de conteúdo, sem participação da UOL, provedor de acesso à Internet, que apenas administra site que contém ferramenta de busca (RADAR UOL), sem qualquer controle do conteúdo das páginas pesquisadas - Ilegitimidade passiva da requerida caracterizada - Litigância de má-fé não caracterizada. Dá-se provimento ao recurso, para o fim de declarar extinto o processo, sem julgamento do mérito, nos termos do artigo 267, inciso VI, do Código de Processo Civil. (Apel. com revisão 03659004500,registrado em 03/12/2009 ).


INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS.INTERNET - CRIAÇÃO DE COMUNIDADE NO SÍTIO "ORKUT", PARA TECER CRÍTICAS À AUTORA, PESSOA JURÍDICA, PRESTADORA DO SERVIÇO DE TRANSPORTE PÚBLICO - INSERÇÃO DE TERMOS CHULOS E BAIXO CALÃO QUE TORNAM, SEM CREDIBILIDADE AS TAIS CRÍTICAS. SUPRESSÃO DAS EXPRESSÕES DETERMINADA EM SEDE DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. PESSOA JURÍDICA QUE NÃO PODE SER VÍTIMA DE INJÚRIA. ENTENDIMENTO PACIFICADO NO COLENDO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. AUSÊNCIA DE OFENSA À HONRA OBJETIVA DA AUTORA.DANO MORAL NÃO CONFIGURADO - RECURSO IMPROVIDO. (Apel. com revisão 5251774000, registro em 03/12/2009 ).


AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. PUBLICAÇÃO DE MATERIAL OFENSIVO NA INTERNET SEM IDENTIFICAÇÃO DO USUÁRIO. RESPONSABILIDADE DA PROVEDORA DE CONTEÚDO. DANO MORAL. ARBITRAMENTO. À medida que a Provedora de Conteúdo disponibiliza na Internet um serviço sem dispositivos de segurança e controle mínimos e, ainda, permite a publicação de material de conteúdo livre, sem sequer identificar o usuário, deve responsabilizar-se pelo risco oriundo do seu empreendimento. Em casos tais, a incidência da responsabilidade objetiva decorre da natureza da atividade, bem como do disposto no art. 3º, § 2º, do Código de Defesa do Consumidor. Não tendo o réu apresentado prova suficiente da excludente de sua responsabilidade, exsurge o dever de indenizar pelos danos morais ocasionados. O arbitramento do dano moral deve ser realizado com moderação, em atenção à realidade da vida e às peculiaridades de cada caso, proporcionalmente ao grau de culpa e ao porte econômico das partes. Ademais, não se pode olvidar, consoante parcela da jurisprudência pátria, acolhedora da tese punitiva acerca da responsabilidade civil, da necessidade de desestimular o ofensor a repetir o ato. (Apel. 1.0439.08.085208-0/001(1), publicação em 16/03/2009).



AÇÃO DE COBRANÇA - INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - SUSPENSÃO DE SERVIÇO DE INTERNET - 06 DIAS - OFENSA À HONRA OBJETIVA - NÃO COMPROVAÇÃO - DEVER DE INDENIZAR - AUSÊNCIA.A pessoa jurídica somente faz jus à indenização por danos morais se ficar comprovado que sua reputação ou imagem foram atingidas no meio comercial por algum ilícito, gerando restrições de crédito, perda de negócios ou outras conseqüências aferíveis objetivamente.A suspensão dos serviços de internet prestados à instituição de ensino, por seis dias, não gera, por si só, dano moral indenizável. (Apel. 1.0686.05.159745-4/001(1), publicação em 17/02/2007).
APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO INDENIZATÓRIA - DANO MORAL - OFENSAS ATRAVÉS DE SITE DE RELACIONAMENTO - ORKUT - PRELIMINAR - ILEGITIMIDADE PASSIVA - REJEIÇÃO - RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA - APLICAÇÃO OBRIGATÓRIA - DEVER DE INDENIZAR - RECONHECIMENTO. QUANTUM INDENIZATÓRIO - FIXAÇÃO - PRUDÊNCIA E MODERAÇÃO - OBSERVÂNCIA NECESSÁRIA - MAJORAÇÃO INDEVIDA. Restando demonstrado nos autos que a apelante (Google Brasil) atua como representante da Google Inc., no Brasil, fazendo parte do conglomerado empresarial responsável pelo site de relacionamento denominado ""Orkut"", compete-lhe diligenciar no sentido de evitar que mensagens anônimas e ofensivas sejam disponibilizadas ao acesso público, pois, abstendo-se de fazê-lo, responderá por eventuais danos à honra e dignidade dos usuários decorrentes da má utilização dos serviços disponibilizados. Desinfluente, no caso, a alegação de que o perfil difamatório teria sido criado por terceiro, pois a empresa ré, efetivamente, não conseguiu identificá-lo, informando, apenas, um endereço de e-mail, também supostamente falso, restando inafastável a sua responsabilidade nos fatos narrados nestes autos e o reconhecimento de sua legitimidade para figurar no pólo passivo da lide. Aplica-se à espécie o art. 927, parágrafo único, do Código Civil, que adota a teoria da responsabilidade civil objetiva, estabelecendo que haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, quando a atividade normalmente desenvolvida implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem. No arbitramento do valor da indenização por dano moral devem ser levados em consideração a reprovabilidade da conduta ilícita e a gravidade do dano impingido, de acordo com os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, cuidando-se para que ele não propicie o enriquecimento imotivado do recebedor, bem como não seja irrisório a ponto de se afastar do caráter pedagógico inerente à medida. (Apel. 1.0024.08.041302-4/001(1), publicação 06/03/2009).

É bom que se atualize sempre sobre conflitos ocorridos com a utilização da internet, daí a importância de se apresentar textos cada vez mais específicos sobre internet banking, falhas na prestação de serviços de telefonia e suas consequências, dentre outros.


Aliás, o tema "internet e indenização" é bastante amplo, no entanto, como este texto visa apenas incentivar a busca de mais informações sobre o tema, oferecendo ao leitor uma noção básica do quanto o assunto é interessante e da necessidade de termos profissionais especializados no tema para que avaliem cada caso como um caso especial.

Então, até o próximo...


Natália Batista
(Pós-Graduanda em Direito Digital e 
das Telecomunicações - Mackenzie). 

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

DIREITOS FUNDAMENTAIS EM COLISÃO: qual deverá prevalecer?

Antes de iniciarmos a breve exposição sobre os direitos fundamentais, é importante analisarmos o Direito considerando-o “Ciência Jurídica” que se relaciona com os ramos das “Ciências Humanas e Sociais”, em que o objeto de estudo é, em síntese, a interpretação das normas frente a um caso concreto.
 
Partindo do princípio de que a base de estudo do Direito é a interpretação das normas e considerando também que todo conceito advém de uma prática hermenêutica, encontramos várias situações em que não há apenas uma solução correta para o caso, justamente, porque a interpretação será realizada por alguém que recebeu diversas influências durante a sua existência.

Quantas vezes nos deparamos com o caso em que duas pessoas analisam uma mesma situação, num mesmo momento, chegando à conclusões opostas?
Isso acontece, porque se tratam de duas pessoas diferentes em suas essências, que receberam influências político-culturais de forma desigual, adquiriram experiências individuais e coletivas de formas específicas.

Diante disso, cada entendimento é resultado de uma interpretação individual, então, não possui caráter absoluto, já que, todos nós estamos sujeitos a um leque de situações, como momentos histórico-culturais, políticos, dentre outros, que influenciam de forma relevante cada ponto de vista.
Normalmente, no momento em que há diferentes interpretações para o mesmo caso ocorre a incidência de dois ou mais direitos ou princípios de ordem constitucional (especialmente, os direitos fundamentais), identificados por sua importância e necessidade de efetivação, já que asseguram as condições básicas para a boa convivência entre todos e impedem que o Estado ultrapasse seus limites.

Assim, tendo em vista a relevância dos direitos fundamentais, em caso de colisão entre eles, qual deverá prevalecer? Como decidir?
A prevalência de um direito fundamental em detrimento de outro não é simples de se verificar, pois em se tratando de colisão entre direitos que estão na mesma hierarquia normativa, apenas restaria a utilização de uma ponderação própria do chamado “homem-médio” a fim de tentar a solução mais justa possível.

Vejamos alguns exemplos:
O médico que tem o dever de “salvar vidas” (ou pelo menos tentar) se vê impossibilitado de efetuar a transfusão de sangue em seu paciente (menor absolutamente incapaz) porque os pais deste não autorizam qualquer transfusão de sangue, sob pena de responsabilização cível e criminal contra o profissional.

Qual direito prevaleceria? O direito à liberdade de religião, pensamento, expressão, (previsto no art. 5º, inciso VI da Constituição Federal de 1988), ou o direito à vida (previsto no art. 5ª, caput da C.F/88) ?
Parece claro que a vida deveria prevalecer por ser o maior bem jurídico que existe neste mundo, entretanto, há pessoas tão comprometidas com suas crenças que são capazes até mesmo de abdicar de sua própria vida em prol daquilo que acreditam.

Por outro lado, vejamos que, apesar de sermos livres para seguirmos qualquer religião, cultura e filosofia, nos deparamos com casos em que são criadas religiões (seitas) para fins de enriquecimento ilícito, ou mesmo com objetivos contrários à moral e aos bons costumes, com rituais que agridem a integridade física e moral dos fiéis.
Percebemos, pelos exemplos citados, o conflito entre o direito à liberdade de expressão e de crença religiosa, “de ir e vir”, e de outro lado, princípios como dignidade da pessoa humana e o direito à integridade física e moral.

Apesar de parecerem absurdas tais situações, inúmeros são os casos em que são questionados preceitos morais, religiosos, ideológicos em confronto com as normas impostas sem que haja solução definidas por lei, como é o caso do aborto referente ao feto anencefálico, ou da eutanásia para os pacientes que há anos sobrevivem em hospitais sem qualquer condição de viver dignamente.
De tempos em tempos, surgem discussões sociais, filosóficas, culturais, religiosas sobre os mais diversos assuntos controversos, porém, os intérpretes e aplicadores do Direito devem analisar com cautela a aplicação dos direitos fundamentais, sem anular direitos, mas sim, mitigando-os em certas situações em busca de uma solução mais justa.

Vejamos outro caso: todo jornalista tem o dever de prestar as informações que se tenha notícia, porém, deve ele se atentar para o fato de que há notícias que são juridicamente sigilosas, e outras ainda, que não deveriam ser prestadas, por se tratar de fatos da intimidade de alguém.
Assim, perante esta situação, o que prevaleceria: o direito à informação e o direito do livre exercício de trabalho do jornalista (art. 5ª, inciso XIII da C.F/88), ou deveria prevalecer o direito à privacidade (dever de sigilo) de eventuais investigações referentes aos casos de segredo de justiça?

Para o jornalista, mais importante é exercer sua profissão nos termos do regulamento sob o qual ele é submetido.
Para os cidadãos, o importante é sempre receber as notícias sem qualquer omissão.

Para a pessoa exposta na mídia, o importante é sua privacidade.

E, para o Estado o essencial é garantir todos esses direitos! Assim, como resolver?
Torna-se indispensável avançar nas investigações sobre a estrutura das normas de direitos fundamentais.

No conflito entre esses direitos-princípios, devemos buscar sempre uma conciliação entre eles, ou seja, a aplicação de cada qual conforme a relevância in casu, sem que um dos princípios venha a ser excluído do ordenamento jurídico por irremediável contradição com o outro.
Necessário entender que não há uma resposta absolutamente correta ou incorreta, mas sim, deve ser buscada como a melhor solução aquela embasada no princípio da razoabilidade (proporcionalidade), conforme entendimento do Supremo Tribunal Federal, afinal, nem todas as situações pensáveis, referidas a um direito, estão necessariamente protegidas por lei, e nesses casos, não há como fugir do tão conhecido “bom senso”.

Entre os renomados autores, a idéia exemplar de Canotilho deve ser difundida.
Para o grande escritor, dois fatores podem auxiliar a interpretação mais razoável para o caso: a) a reserva de amizade e, b) a não prejudicialidade.

Tais fatores operariam a partir de uma ponderação de princípios constitucionais, para excluir certas situações do âmbito de proteção da norma constitucional, justificando que o que causar menos prejuízo, ou o que for mais coerente deverá sempre prevalecer.
Assim, concluir por meio de uma só resposta sobre quais os direitos devem sempre prevalecer não é tarefa simples, aliás, considera-se impossível, cabendo à doutrina e à jurisprudência promover cada vez mais discussões neste sentido para que a decisão judicial seja sempre a mais próxima da decisão ideal.

Enquanto não são ampliadas as discussões sobre casos envolvendo conflitos aparente de normas e princípios, o que se espera é, no mínimo uma cautela maior, o bom senso do aplicador do Direito, sendo fiel aos valores predominantes na sociedade em que se está inserido, mediante soluções técnicas, com respaldo social, e acima de tudo, justas.

Natália Batista - Especialista em Direito Constitucional pela Unisul em 2007.

terça-feira, 27 de outubro de 2009

Resoluções da ANATEL e as decisões Judiciais: insegurança jurídica generalizada

1. Noções preliminares sobre as funções da Anatel

Antes de qualquer notória crítica sobre a incerteza frente aos conflitos de normas no sistema legal brasileiro, especialmente, quanto à matéria dos serviços de telecomunicações, é necessário um breve comentário sobre os atos administrativos e a necessidade de controle pelo Poder Judiciário, principalmente quanto sua legalidade.

É clara a evolução da tecnologia, concomitantemente, a evolução do próprio conceito de eficiência na prestação dos serviços ao longo dos anos, tanto que, o legislador entendeu necessário incluir expressamente o princípio da eficiência no rol de princípios constitucionais administrativos, nos termos do Art. 37 da Carta Magna.

O chamado “novo modelo” (já ultrapassado) da Administração Pública consiste no maior afastamento do controle do Poder Público frente aos serviços públicos não essenciais e a adoção do sistema regulatório, sem subordinação ao poder econômico do capital privado, reduzindo substancialmente os procedimentos burocráticos estatais.

À primeira vista, deveria haver mais vantagens frente à modernidade das agências reguladoras, como a ANATEL, porém, surgem críticas cada vez mais intensas a este tipo de instituição.

Afinal, qual a função das Agências Reguladoras?

Em linhas gerais, os doutrinadores e a própria lei definem como funções primordiais das Agências Reguladoras as seguintes: (i) fiscalizar a atuação das empresas concorrentes, (ii) dirimir as controvérsias e conflitos que surgirem entre as agências, o governo e os usuários, (iii) traçar a política de tarifação, coibindo as práticas prejudiciais à concorrência, concentrando a atuação em três frentes: regulamentadora, fiscalizadora e sancionadora, nos termos do artigo 19 da Lei nº 9.472/97.

Dentre as funções desempenhadas pelas Agências, em específico, a ANATEL, a função regulamentadora é a mais debatida entre os juristas.

Para a grande estudiosa Maria Sylvia Zanella di Pietro, o vocábulo regular significa:

"estabelecer regras, independentemente de quem as dite, seja o Legislativo ou o Executivo, ainda que por meio de órgãos da Administração direta ou entidades da Administração indireta. Trata-se de vocábulo de sentido amplo, que abrange, inclusive, a regulamentação, que tem um sentido mais estrito".

"regulamentar significa também ditar regras jurídicas, porém, no direito brasileiro, como competência exclusiva do Chefe do Poder Executivo (artigo 84, IV), não sendo incluído, o parágrafo único do mesmo dispositivo, entre as competências delegáveis" (134)


Neste aspecto, um dos conflitos mais acirrados é o conflito entre as resoluções da ANATEL definidas por diretrizes políticas, considerando na maioria das vezes apenas aspectos técnicos sem se atentar para a viabilidade econômica e muito menos para os aspectos jurídicos, como: coisa julgada, direito adquirido, segurança jurídica dos contratos, dentre outros.

Assim, o Poder Judiciário é visto como última opção para tentar remediar algumas resoluções esdrúxulas da ANATEL em prol da defesa dos interesses e direitos individuais e coletivos, já que, não se pode excluir da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de lesão a direito, conforme expresso no inciso XXXV da CF/88.

Neste aspecto, um dos conflitos mais acirrados é o conflito entre as resoluções da ANATEL definidas por diretrizes políticas, considerando na maioria das vezes apenas aspectos técnicos sem se atentar para a viabilidade econômica e muito menos para os aspectos jurídicos, como: coisa julgada, direito adquirido, segurança jurídica dos contratos, dentre outros.


Ocorre que, embora prevista a autonomia da ANATEL para regular as decisões na sua esfera administrativa, coexiste a previsão legal (necessária) da atuação do Poder Judiciário a fim de limitar o poder das decisões emanadas de órgãos da Administração Pública, inclusive os que têm força jurisdicional. Isso, porque, os atos administrativos discricionários, ou seja, aqueles decididos conforme a "conveniência" e "oportunidade" são passíveis de revogação pelo próprio agente público e não deveriam ser apreciados pelo Poder Judiciário.

Por outro lado, os atos administrativos dotados de ilegalidade podem e devem ser revistos e anulados pelo Poder Judiciário, uma vez que cabe ao Poder Judiciário preservar o “Estado Democrático de Direito” nos termos da CF/88 a qual centraliza no Judiciário o exame da legalidade dos atos administrativos. Mesmo assim, o controle a ser realizado pelo Poder Judiciário também é limitado pelo próprio princípio da legalidade, já que, alguns atos administrativos são eximidos de ratificação pelo Poder Judiciário.

Diante das noções preliminares apresentadas, analisemos as Resoluções elaboradas e publicadas pela ANATEL.

Vejam que a maioria de suas Resoluções é evidente a falta de coerência e planejamento sistemático da Autarquia, sendo ausente qualquer parâmetro definido pela mesma, já que, em alguns momentos as Resoluções são completamente válidas, e em outros casos a política desejada é claramente alterada.

Isso, sem contar nas muitas ocasiões em que o Poder Judiciário simplesmente desautoriza as determinações de ANATEL, como por exemplo, ocorreu no caso referente à proibição ou permissão das cobranças de pontos adicionais das empresas que prestavam serviços de televisão à cabo.
 
2. Necessidade de Controle do Poder Judiciário

Diante da falta de interpretação sistemática e determinação contraditória contida nas Resoluções da ANATEL, o Poder Judiciário que figurava como mero conferente dos aspectos formais do ato administrativo, hoje em dia, se faz necessário a fim de que se tenha protegida a isonomia das partes, bem como, se promova a paz social e a efetivação das normas e julgados, por ser notório que os Magistrados, Desembargadores e Ministros possuem critérios melhor definidos quanto à razoabilidade, moralidade, eficiência e dignidade da pessoa humana.

Ademais, certo é que as Agências Reguladoras não estão eximidas do controle que o Poder Judiciário exerce, em razão do princípio constitucional da inafastabilidade do controle jurisdicional, nos termos do artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal, embora com ponderações.

Assim, muito bem esclareceu Ruth Helena de Oliveira: "qualquer ato praticado pela agência pode ser submetido à apreciação do Judiciário, e esse poder poderá examinar os atos da agência sempre sob o aspecto da legalidade e da moralidade e, em tese, jamais poderá invadir os aspectos reservados à apreciação subjetiva (oportunidade e conveniência)". E, ainda completou, "o Poder Judiciário não poderá interferir nos assuntos que digam respeito à atividade técnica da agência, quando estes não ferirem os princípios da Administração Pública".

Apesar das ponderações, é essencial que se entenda: o cidadão ainda deposita muito mais sua confiança no Poder Judiciário do que nos Poderes Legislativo e Executivo. E, no caso de análise referente às Resoluções da ANATEL dotadas de possíveis ilegalidades o controle pelo Poder Judiciário deve ser feito de forma difusa, o que dificulta a eficácia no controle da legalidade destas normas expedidas pelas Agências Reguladoras.

Desta forma, mais vantagem seria um controle concentrado de legalidade pelo Poder Judiciário, em que uma decisão judicial proferida em um dos processos produziria efeito vinculante para todos os demais processos envolvendo o mesmo assunto, em busca de uma coerência nacional, impedindo que hajam decisões totalmente discrepantes no mesmo país! Isso traria vários benefícios não apenas aos consumidores, mas também às Empresas, já que, não haveria tanta vulnerabilidade ou insegurança como ocorre.

Ora, qual a função de afastar a aplicação das normas regulatórias visivelmente ilegais para alguns e mantê-las aplicáveis para outros?

Partindo deste questionamento, o modelo concentrado de controle de legalidade seria a melhor saída para a solução destes casos, tornando eficaz o controle de legalidade e possível a efetivação das decisões.

Ademais, nos casos em apreço, como os da verificação das Resoluções da ANATEL, por serem dotadas de matérias excessivamente técnicas, em geral, alheias ao cotidiano dos Magistrados, devem ser criadas Câmaras Especializadas no assunto, inclusive incentivando os Juízes de Primeira Instância a buscarem cursos sobre o tema, a fim de que o julgamento seja o mais razoável, coerente e justo possível.

3. Da insegurança jurídica aos consumidores e às empresas
Conforme esclarecido acima, a produção quantitativa de Resoluções (normas) da ANATEL tenta sobrepor à produção legislativa, com o fundamento de que tais Conselheiros possuem mais conhecimento da matéria, porém, não basta o conhecimento técnico na área de Telecomunicações, e sim é essencial que haja a interdisciplinariedade das matérias, inclusive mediante a composição de Conselheiros que atuem nas áreas da Economia, do Direito, da Biologia, dentre outras.

Não sendo assim, considerando o controle difuso realizado pelo Poder Judiciário frente às Resoluções apenas poderá ser instaurado um processo judicial para discussão sobre eventual ilegalidade de Resolução se houver lesão, e os obstáculos não param por aqui.

A falta de conhecimento técnico do setor referente às Telecomunicações poderá prorrogar demasiadamente o julgamento do caso, o que gerará demandas acumuladas e sem julgamento célere.

Ademais, normalmente, os Magistrados fazem uma análise meramente pontual e não global da normatização setorial, o que afasta alguns aspectos importantes que poderiam ser analisados como: a ordem econômica, o meio ambiente, a produção de novas tecnologias aliada ao desenvolvimento sustentável, o que torna impossível a moderação nos interesses envolvidos, pois embora a coletividade não possa ser prejudicada por determinações incoerentes, é necessário que não sejam as Empresas sacrificadas pela falta de organização e coerência do Estado como um todo.

Está-se diante de uma perigosa artimanha do Poder Público, que mesmo afastado do controle das Autarquias, ainda continua de forma camuflada no controle de interesses dos grupos que gerenciam tais Instituições.

Vejam ainda que, não há legitimação democrática das Agências, já que os seus cargos superiores são ocupados por membros indicados sempre pelo governo, o que demonstra claro desvio político, e ainda, pode conduzir aos desvios indesejáveis na regulação econômica, moldando suas decisões conforme os interesses dos seus “padrinhos”.

O próprio Celso Antônio de Melo (2001) entendeu que a não eleição dos agentes nas Agências Reguladoras ocasionaria alta delegação sem responsabilização, o que geraria ineficiência dos serviços e insegurança.

Outrossim, a baixa delegação sem responsabilização, também geraria ineficiência e insegurança, uma vez que o controle da atividade de qualquer Agência se destina a conferir legitimidade democrática à atuação de agentes não-eleitos pelo povo.

Em suma, a insegurança é generalizada!

A coletividade está despida de meios eficazes para combater as Resoluções das Agências Reguladoras, em especial, a ANATEL, assim como, as empresas que já não sabem a quem recorrer, pois não sabem se num conflito aparente de normas, ou seja, entre as resoluções da ANATEL e as normas gerais, assim como frente às decisões judiciais já proferidas qual a verdadeira imposição deverá prevalecer.

Por tudo isso, é essencial o estabelecimento de um Estatuto de direitos e deveres na prestação dos serviços de Telecomunicações contendo claramente os deveres e os direitos às Empresas e aos usuários, evitando inúmeras demandas desnecessárias e a insegurança frente às normas mutantes da ANATEL.

Espera-se que tais críticas à ANATEL, não se percam no tempo, mas sim, que sirvam como um olhar atento para que todos da sociedade civil não se deixem levar pelas decisões sem reflesões mais aprofundadas!

É necessário um controle constante da sociedade e empresas, a fim de que os consumidores não acreditem puramente nas intenções do Estado - quando este utiliza o discurso "para o bem da coletividade", e nem as Empresas se submetam às "mudanças de humor" da ANATEL sem que pressionem o governo a tomar uma decisão com prazo mais razoável para execução e sem que prejudique os diversos investimentos já realizados pelas mesmas a fim de tornar mais eficientes seus serviços.

Cabe lembrar que nenhum contrato pode ser alterado unilateralmente, inclusive os assinados entre as Empresas de Telecomunicações e o Estado, a não ser que sejam ressarcidos os eventuais danos. Também, não podem ser criadas normas e, neste caso, Resoluções sem qualquer parâmetro, incoerentes, nem as que estabeleçam sanções excessivas capazes de onerar gravosamente as empresas que tanto investem em nosso país.

Por tudo isso, não devemos depositar a responsabilidade de controle apenas no Poder Judiciário, e sim devemos apresentar sempre outras possibilidade, mediante discussões entre profissionais de várias áreas com o objetivo principal de fazer valer os direitos da coletividade e das empresas privadas prestadoras de serviços públicos, assim como garantia a segurança jurídica para o sistema que rege os serviços de telecomunicações e demais serviços públicos, ainda que prestados por empresas privadas.


 
4. Conclusão

Tendo em vista a análise apresentada, embora seja a ANATEL a autarquia destinada a regular, fiscalizar, fomentar e zelar pela correta prestação do serviço público, é extremamente necessário a definição mais completa e precisa dos parâmetros a serem utilizados na criação das Resoluções.

Isso, porque, não basta a análise apenas sob o ponto de vista técnico, nem somente sob o ponto de vista jurídico, mas toda e qualquer resolução deveria ser criada mediante análise econômica, social, jurídica, técnica e com perspectiva de efetivação ao longo dos anos.

Se assim não for, qual a verdadeira função da Anatel?

Ser questionada e criticada sempre?

Acredita-se que esta não foi a real intenção de seus criadores!

Natália Batista
(Graduada pela Universidade Federal de Uberlândia/MG,
Pós-Graduada em Direito Constitucional pela Unisul/SC e
estudante de Pós-Graduação em Direito Digital
e das Telecomunicações pelo Mackenzie/SP).
Texto elaborado em 16/05/2009.