A responsabilidade civil dos profissionais liberais é um tema que chama bastante atenção de boa parte da sociedade moderna. Isso, porque, grande parte da sociedade brasileira, por exemplo, é formada por profissionais liberais.
Nas palavras de Fernando Antônio Vasconcelos, a profissão liberal:
"[...] é aquela que se caracteriza pela inexistência, em geral, de qualquer vinculação hierárquica e pelo exercício predominantemente técnico e intelectual de conhecimentos especializados, concernentes a bens fundamentais do homem, como a vida, a saúde, a honra, a liberdade."
Como exemplos de profissionais mais comumente identificados como liberais, temos: os médicos, dentistas, contadores, engenheiros, contadores, agrônomos, veterinários, advogados, dentre outros.
Ao estudarmos especificamente o serviço do advogado e a possibilidade de sua responsabilização civil frente a atos que geraram danos aos seus clientes ou a terceiros, percebemos a importância de uma boa formação profissional, dedidação constante e atenção nos seus atos durante todo o exercício da profissão.
A importância do profissional que exerce a advocacia está expressa na Constituição Federal de 1988, no artigo 133 que garante ao Advogado a inviolabilidade por seus atos e manifestações no exercício da profissão, então, vejamos:
“O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei.” (CF/88, art. 133).Além disso, o Código de Ética e Disciplina da OAB e seu Estatuto (Lei 8.906/94) apresentam diversas normas quanto à importância da advocacia e os cuidados para que sejam prestados serviços de excelência, com ética, eficiência e cautela.
Ademais, o Código de Defesa do Consumidor, em meio a regra geral pela responsabilização objetiva dos fornecedores, criadores, fabricantes, dentre outros, deixa expressamente definido a exceção em relação aos profissionais liberais:
“A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa”.
Por qual motivo os profissionais liberais apenas deverão ser responsabilizados mediante a verificação de culpa, ou seja, mediante aplicação da teoria da responsabilidade subjetiva?
Inicialmente, cabe ressaltar que está-se diante de uma relação contratual entre profissional libera e cliente, sendo caracterizada relação de consumo, tendo em vista os conceitos definidos nos artigos 2º, 3º do Código de Defesa do Consumidor.
De um lado, encontramos as obrigações dos Advogados, quais sejam, promover a defesa do cliente ou ingressar com demanda judicial em seu favor, aconselhando-o profissionalmente sobre os riscos da demanda e custos, agir da melhor forma possível para representá-lo perante o Poder Judiciário ou órgãos públicos e administrativos, demonstrando conhecimento jurídico suficiente para alcançar o objetivo pretendido.
De outro lado, o cliente deve contribuir para o bom andamento do processo, já que um laço de confiança surge no nomento da contratação e deve ser mantida sempre.
As obrigações dos clientes consistem em: apresentar todos os documentos necessários, falando a verdade para seu Advogado, expondo tudo que for relativo à demanda judicial, contribuindo com a pronta execução de eventuais solicitações de seu Procurador.
Ocorre que há casos em que a obrigação do Advogado se caracteriza como obrigação de resultado, como por exemplo, é solicitado um trabalho em que é inteiramente possível de ser executado, sem depender de Poder Judiciário ou terceiros.
Nas palavras do autor Sílvio Venosa, ficou ponderado o seguinte:
“(...) Na elaboração de um contrato ou de uma escritura, o advogado compromete-se, em tese, a ultimar o resultado. A matéria, porém, suscita dúvidas e o caso concreto definirá eventual falha funcional do advogado que resulte em dever de indenizar.
Em síntese, o advogado deve responder por erros de fato e de direito cometidos no desempenho do mandato.
O exame da gravidade dependerá do caso sob exame. Erros crassos como perda de prazo para contestar ou recorrer são evidenciáveis objetivamente. Há condutas do advogado, no entanto, que merecem exame acurado. (...)”.
“(...) Não devemos esquecer que o advogado é o primeiro juiz da causa e intérprete da norma. Deve responder, em princípio, se ingressa com remédio processual inadequado ou se postula frontalmente contra a lei.”
O Advogado que ajuiza Ação sem que tenha base legal de sustentação do pedido no ordenamento jurídico pode ser responsabilizado não apenas de forma civilmente, mediante condenação por reparação de danos, mas também administrativamente, via Tribunal de Ética da OAB.Nos termos do Art. 32 (Estatuto OAB):
“O advogado é responsável pelos atos que, no exercício profissional, praticar com dolo ou culpa. Parágrafo único. Em caso de lide temerária, o advogado será solidariamente responsável com seu cliente, desde que coligado com este para lesar a parte contrária, o que se apurado em ação própria”.Embora a declaração de litigância de má-fé não seja tão frequente nos Tribunais, é certo que, uma vez identificada a lide temerária, o Advogado pode ser condenado a arcar com multa do Art. 18 do Código de Processo Civil, e além disso, deve reparar os danos comprovados pelo cliente ou parte contrária.Para que o Advogado se resguarde de eventuais problemas com seu cliente, o melhor mesmo é elaborar um bom contrato de serviços e honorários advocatícios, devendo constar sobre os serviços a serem prestados, o período, o valor, a forma de pagamento, a multa por rescisão sem causa, seja do advogado, seja do cliente, os contatos das partes, dentre outras informações.
Além disso, mediante maior precaução e dever de transparência, cabe ao Advogado solicitar um resumo dos fatos para o cliente, ou manuscrito ou assinado pelo mesmo, a fim de que não haja contrivérsias no momento do seguimento processual.
Quanto aos honorários advocatícios, existe entendimentos de todas as formas.
Alguns entendem que o limite ético na contratação dos honorários advocatícios para o ajuizamento de ações cíveis patrimoniais/obrigacionais sejam de até 20% (vinte por cento), além dos honorários de sucumbência.
Outros entendem que, no contrato de risco maior do que o normal, em que a parte não possui dinheiro para arcar com parcela do pagamento, é totalmente possível que seja pago ao final da demanda, com o recebimento do valor entre 30% a 40% do que for recebido.
Existem cobranças de até 50% dos valores recebidos pelo cliente.
Tal assunto é bastante discutido nos Tribunais de Ética da OAb espalhados pelo Brasil. Não há uma porcentagem previamente definida, porém, o que se tem é que deve ser cobrado valor razoável, observando o tempo em que o processo esteje sob patrocínio do Advogado, a matéria discutida (se é complexa ou simples), os gastos com despesas de xerox, gasolina, viagens, etc, dentre outras informações.Para citar, o entendimento da OAB/SP em julgamento de processos administrativos nos Tribunais de Ética e Disciplina foi no seguinte sentido:
HONORÁRIOS QUOTA LITIS ACRESCIDOS DA SUCUMBÊNCIA. POSSIBILIDADE DESDE QUE NÃO ULTRAPASSEM OS VALORES RECEBIDOS PELO CLIENTE. O PERCENTUAL DE 30%, A TÍTULO DE QUOTA LITIS, É ACEITÁVEL. PERCENTUAL SUPERIOR PODE CARCTERIZAR IMODERAÇÃO. EXEGESE DOS ARTS. 1º, 2º, 36, 38 E SEU PARÁGRAFO DO CÓDIGO DE ÉTICA E ITEM 79 DA TABELA DA OABSP. Os honorários sempre deverão ser pagos em pecúnia. A cláusula quota litis é exceção à regra. Esse tipo de cláusula contratual, como exceção é admitida em caráter excepcional, na hipótese de cliente sem condições pecuniárias, desde que contratada por escrito. De qualquer forma, a soma dos honorários de sucumbência e o de quota litis, não pode ser superior às vantagens advindas a favor do cliente (art. 38, "in fine"). Ao advogado é vedado participar de bens particulares do cliente. Os olhos do advogado devem fixar-se nos preceitos e princípios da ética, a fim de que não venham a ofender o direito e a justiça. (Proc. E-3.025/2004 – v.u., em 16/09/2004, do parecer e ementa do Rel. Dr. JOSÉ ROBERTO BOTTINO – Ver. Dr. LUIZ ANTÔNIO GAMBELLI - Presidente Dr. JOÃO TEIXEIRA GRANDE)."Em contratos com pacto "quota litis"ou ad exitum, com despesas processuais suportadas pelo próprio advogado, 30% (trinta por cento) não representam imoderação, dada a dificuldade dos serviços prestados, a duração da lide em cerca de 3 (três) anos, mais as despesas processuais suportadas pelo próprio profissional". (Processo E-1.577/97, Rel. Geraldo José Guimarães da Silva, unânime, 18.09.97)."Não comete infração ética o advogado que, em ação previdenciária, contrata honorários de 30% sobre o provento do cliente, suportando as despesas judiciais, com recebimento da contraprestação condicionado ao sucesso do feito. Recomenda-se que a contratação seja feita por escrito, contendo todas as especificações e forma de pagamento, atendendo-se ao prescrito pelo art. 36 do CED". (Processo E-1784/98, Rel. Ricardo Garrido Júnior, unânime, 11.02.92).
O Conselho Federal da OAB reconhece algumas condutas abusivas quando:
"Constitui violação disciplinar punível com pena de suspensão o advogado que, em Contrato escrito para recebimento de seguro via alvará, fixa seus honorários em 50% do valor do seguro". (Recurso nº 008/2004/SCA-MG, Rel. José de Albuquerque Rocha (CE), Ementa 034/2004/SCA, J: 05/04/2004, unânime, DJ 12/05/2004, p.544, S1)."Comete infração disciplinar o advogado que cobra de cliente, em reclamação trabalhista, honorários equivalentes a 43% (quarenta e três por cento) do valor da condenação. Não cabe à Ordem dos Advogados do Brasil apreciar, em processo disciplinar, a validade de contratos de honorários, mas apenas a sua adequação aos preceitos éticos que devem pautar a conduta dos advogados. A cobrança abusiva de honorários advocatícios configura violação ao artigo 36 do Código de Ética e Disciplina da OAB. Recurso conhecido e parcialmente provido". (Recurso nº 0022/2003/SCA-SP, Rel. Ulisses César Martins de Sousa (MA), Ementa 047/2004/SCA, J: 08/03/2004, unânime, DJ 16/06/2004, p.295, S1).Desta forma, caberá ao Advogado ponderar se vale a pena correr o risco pela cobrança de valor tão alto ao cliente.
Até mesmo no caso de extravio de autos o Advogado pode ser responsabilizado.
Além da obrigação de restaurar os autos, seja com suas cópias, ou cópias de seu colega da parte contrária, ainda deve comunicar imediatamente o Juiz da causa e a OAB. Se mesmo assim, houver dano à parte, caberá ao prejudicado ingressar com Ação de Reparação de danos em desfavor do Advogado, e até mesmo receber o valor proporcional se for demonstrada a perda de chance no sucesso da demanda.
É claro que o Advogado que não dá importância ao andamento do feito, não cumpre as determinações ordenadas pelo juiz, não comparece às audiências ou omite-se na apresentação de recurso, contestação, poderá ser responsabilizado civilmente.
A efetivação desta responsabilização dependerá da comprovação por parte do cliente de ATO ou OMISSÃO praticada pelo Advogado que tenha ocasionado DANO EFETIVO, e que tais atos ou omissões tenham sido praticados por culpa do profissional, ou seja, o cliente deverá comprovar que o profissional agiu com negligência, imprudência ou imperícia.Existem diversos casos que podem ocasionar a responsabilização civil dos Advogados, como: a) apropriação de dinheiro do cliente; b) desobediência das instruções do cliente; c) imposição de multa por litigância de má-fé se o profissional deu causa para tanto; d) perda de prazo, dentre outros.Cabe ressaltar que, alicerçado nos princípios da ampla defesa e do contraditório, o Advogado poderá se defender da demanda comprovando, por exemplo que não houve dano efetivo, elemento fundamental para a responsabilização civil. Pode ainda demonstrar que o simples fato de não ter cumprido um prazo (*dependendo do prazo) não teria acarretado qualquer dano ao cliente, já que seria configurado como mero procedimento protelatório nos autos, já que a jurisprudência daquele Tribunal é unânime na decisão contrária da pretendida.
Isso poderia ser comprovado mediante juntada de diversas decisões do mesmo juiz, ou do mesmo Tribunal/Câmara, e ainda, demonstrando que tal via judicial não poderia gerar reconhecimento do direito de seu cliente.No entendimento de Maria Helena Diniz, Saraiva, 2007, p. 281:
"O Advogado somente será responsabilizado pelo fato de não haver recorrido, se este era o desejo do seu constituinte e se havia possibilidade de ser reformada a sentença mediante interposição de recurso, cabendo ao seu cliente a prova de que isso aconteceria (RT, 104:458) (De acordo com DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. 21. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007. v. 7. p. 281).É claro que, neste caso, a perda de chance do cliente apenas aconteceu por conduta culposa do Advogado.Embora o Advogado tenha garantia constitucional de exercer a profissão sem que tenha que responder por difamação e injúria quando lida com as palavras, a calúnia e o desacato podem gerar responsabilização civil para o Advogado(Lei n. 8.906/94, art. 34, XV), portanto, é necessário bastante cuidado no exercício da profissão.Quando o Advogado omite informação ao cliente acerca das vantagens e desvantagens da ação ajuizada ou que ainda será proposta, ou enriquece-se ilicitamente à custa do cliente ou da parte adversa, por si ou por interposta pessoa, ou ainda, gera prejuízo ao cliente ao violar os princípios da probidade e da boa-fé objetiva, sempre poderá sofrer Ações de reparação de danos, desde que comprovado os elementos da culpa.
Neste momento, devem estar se perguntando: por que um tema tão diferente do direito digital e telecom?
Simples.
Para que se possa advogar nesta área, não basta ser um advogado civilista, "pau-pra-toda-obra" (com o perdão das palavras).
O ramo do direito digital, direito da internet, exige atualização constante, quase que instantânea, leitura diária sobre o assunto, e busca pelo aprimoramento do conhecimento a cada dia.
O ramo do direito das telecomunicações, considerando as empresas de telefonia, tv a cabo, internet, rádio, televisão, dentre outros, exige também aprimoramento constante.
Então, o advogado que lida em áreas que não conhece e causa danos aos clientes, sejam esses grandes empresas ou pessoas físicas, podem ser responsabilizados?
Lógico que sim! Basta comprovar os elementos da responsabilidade civil, e a culpa, se tratar-se de obrigação de meio.Diante de toda esta exposição, não resta dúvida de que a Advocacia não é uma atividade para "ser levada na brincadeira", como se fosse um jogo de azar em que se convencer o Juiz, ótimo; se não convencer, tudo bem também.
Basta!Estamos cansados das inúmeras Ações judiciais que encontramos em nosso caminho que se configuram como CLARAS AVENTURAS PROCESSUAIS, e apenas aumentam o trabalho do Poder Judiciário.
Basta!O aumento de Faculdades de Direito que jogam no mercado de trabalho cada vez mais profissionais despreparados e mercenários, sem conhecimento de base!
Um "basta" para aqueles que não têm compromisso com o futuro da nossa classe (tantas vezes criticada injustamente), por culpa de uma minoria que consegue fazer um verdadeiro estrago!
Natália BatistaAdvogada Especialista em Direito Digital e TelecomUberlândia/MG e região
Como sempre uma leitura imprescindível, de uma advogada extraordinária. Parabéns pelo artigo.
ResponderExcluirObrigada, Dr!
ResponderExcluirDrª Natália, gostei muito do artigo, pois esclarece questões conceituais a cerca do tema.
ResponderExcluirAlém do mais, sua capacidade de escritora lhe possibilita se fazer entender. É isso que o leitor busca.
Parabéns!
Virginio Vasconcelos (Estudante de Direito em Caruaru/PE)
Obrigada pelo elogio!
ResponderExcluirMeu interesse é repassar meus conhecimentos e buscar sempre uma troca de conhecimento da forma mais fácil possível.
Sempre que puder, leia e comente!
Sugira assuntos também!
Abraços,
Bom dia!!!!Parte de minha monografia e exatamnte nesse tema, obrigada por contribuir...encontrei aqui a resposta para uma das duvidas que adquiri apos trabalhar nela.
ResponderExcluir